Em Ideias Para Adiar o Fim do Mundo, o ambientalista e filósofo indígena Ailton Krenak dialoga com os leitores sobre a relação dos humanos com a natureza, destacando nosso poder destrutivo. Por meio desta obra, o escritor nos mostra que as coisas podem ser muito mais simples do que parecem.
Há uma diferença entre ouvir algo diretamente e ouvir algo pela boca de outras pessoas. Neste mundo tão conectado, às vezes é difícil entender como outra pessoa pensa de verdade. Tudo parece tão preparado, tão sistematizado para conseguirmos compreender. Porém, existem assuntos que só entendemos quando ouvimos.
E, em Ideias Para Adiar o Fim do Mundo, Ailton Krenak nos faz ouvir. Não é romântico de primeira. Krenak não nos traz uma cadeira e uma xícara de chá para ouvirmos o que ele pensa. Na verdade, estamos de pé, na primeira fila, o ouvindo andar de um lado para o outro enquanto sua voz consegue de alguma maneira trovejar por meio das palavras.
Somos recebidos com revolta, dor, angústia e indignação… E, é tão fácil sentir o amor que ele possui por sua casa, sua família, sua ancestralidade que simplesmente… sentimos. O autor consegue nos envolver em um discurso eloquente e intenso sobre suas raízes. Ailton fala sobre como o povo indígena sofre marginalizado para cuidar de sua terra, sobre o que devemos aprender com esses povos que resistiram por tanto tempo, exalta o poder do único, do cativante, da beleza natural.
Ailton Krenak realmente sabe como encantar um leitor de primeira viagem no ambientalismo. De maneira inteligente, usa de exemplos simples e linguagem do cotidiano para que sua mensagem seja passada a todos. Em poucas páginas, Krenak consegue cobrir uma gama de assuntos como racismo, natureza e capitalismo, ainda que seja de maneira superficial.
Em 2018, quando estávamos na iminência de ser assaltados por uma situação nova no Brasil, me perguntaram: “Como os índios vão fazer diante disso tudo?”. Eu falei: “Tem quinhentos anos que os índios estão resistindo, eu estou preocupado é com os brancos, como que vão fazer para escapar dessa”.
A escrita informal do autor se dá inteiramente por ser uma espécie de transcrição de uma palestra. Isso traz um tom orgânico ao texto, bem agradável de ser lido. Conseguimos entender bem seu ponto de vista da parte do povo indígena, além de ver por suas lentes como encara o mundo do homem moderno.
Ao mesmo tempo, não deixa de lado seu lado poético em alguns momentos. Podemos ver seu otimismo estampado nas linhas escritas. Krenak sente dor, dor de observar o que ama sendo banalizado e destruído. Mesmo assim, tem como natureza acreditar, ter a esperança de que ainda há gente que se importa com o que não é mais visto como importante. Krenak acredita, e, porque acredita, triunfa.
Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em
sociedade, do próprio sentido da experiência da vida. Isso gera uma intolerância
muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de
estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente
espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover.
Ideias Para Adiar o Fim do Mundo é um grito no meio da selva, uma fogueira cujas chamas gritam para serem ouvidas perto do som esmagador da metrópole. É bruto, mas também um discurso muito refinado, acessível para quem estiver por perto e se interessar. Ah, e quais são as ideias para adiar o fim do mundo? Melhor ler do que contar, né?!