Dirigido por Christopher Nolan, Oppenheimer chega aos cinemas nesta quinta-feira (20). O longa, adaptado da obra Oppenheimer: O triunfo e a tragédia do Prometeu Americano, de Martin Sherwin e Kai Bird, mostra a biografia completa daquele que seria chamado de ”pai da bomba atômica”. J. Robert Oppenheimer foi um cientista famoso por comandar o Projeto Manhattan, a equipe responsável pelo desenvolvimento da bomba atômica para os EUA durante a Segunda Guerra Mundial.
Posteriormente ele se tornou presidente da Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos, onde trabalhou para retardar o desenvolvimento da corrida armamentista nuclear com a União Soviética. Então, em 1954, ele foi tachado de comunista por sua afiliação a vários grupos, sendo assim dispensado do serviço do Governo Federal dos EUA. Mas certamente continuaria com suas contribuições para a ciência como professor e físico teórico durante seu exílio.
O filme acompanha todos os acontecimentos citados acima. Oppenheimer (Cillian Murphy), tem a missão de projetar e construir as primeiras bombas atômicas da história. Assim, tanto ele quanto um grupo formado por outros cientistas são envolvidos no processo de desenvolvimento da arma nuclear responsável pelas tragédias nas cidades de Hiroshima e Nagasaki.
Nolan, um cineasta completamente devoto à experiência do cinema, queria mostrar essa história da maneira mais grandiosa possível. Uma tela de cinema normal tem uma proporção de 16:9, enquanto a proporção de 1.90:1 do IMAX é aproximadamente 26% maior. Nesse sentido, Nolan optou por filmar Oppenheimer inteiramente em IMAX. Sendo que esses rolos de filme se estendem por 17 km e pesam até 272 kg. Contudo, apenas 30 salas de cinema no mundo todo terão essa exibição ”perfeita” que o diretor idealizou.
Oppenheimer em sua forma
É interessante como a escolha de Nolan ao trazer objetividade nos momentos em preto e branco, e subjetividade nos momentos coloridos, traz vida à sua estrutura narrativa. Embora seja uma história com pontos fixos, ela possui diversas vertentes que moldam outro tipo de exposição dos fatos, fazendo com que tudo tenha mais de uma interpretação e possa ser questionado. Dessa forma, a tomada de decisão de reunir o filme entre momentos antes da criação da bomba atômica e o após isso, trazendo uma linguagem semelhante ao filme A Rede Social, por exemplo, é sagaz.
Vale apontar o cuidado no design de produção. As inúmeras locações reais e a exaltação dos efeitos práticos que somente o Nolan preza com tanto vigor é, sim, incrível. Mas isso tudo é sublimemente complementado pelo zelo no figurino, polimento visual e como utiliza da iluminação para retratar seus personagens e suas inserções. O trabalho de maquiagem é realmente cativante, tendo em vista a gradualidade e o convencimento de esquecermos que esses atores não estão tão velhos assim.
Nesse sentido, existe uma relevância dada a cada ambiente, e como aquilo está na história, tendo textura e peso. Não é somente pelo fator contemplativo, mas como serve ao propósito. Da mesma forma que determinados traços e enquadramentos evidenciam o papel de um personagem, seja num contexto importante e significativo, até a algo mais vilanesco.
E por ser um filme que logo em sua proposta não abraça uma verdade absoluta, há espaço para o cineasta explorar algo que talvez ele nunca tivesse feito com tanto peso: uma idealização literal. Chega a impressionar a quantidade de vezes que Oppenheimer está vivendo um momento comum, mas em sua mente perturbada, imagina as coisas mais horríveis (e reais) acontecendo. O que dá brecha para momentos tensos, incomodativos e desorientadores, mesmo sendo lúdico. Fazendo com que, acima de tudo, esse filme seja uma viagem no psicológico do personagem.
O momento tão esperado
Este é um filme de grandes atuações. Robert Downey Jr., como o esperado, sabe dividir a bola e funciona muito bem como coadjuvante. Ele é fascinante em cena, entregando o texto com força e impacto em cada palavra dita. Assim, é ótimo ver que ele continua em forma para papéis que exigem uma entrega dramática um pouco fora do convencional, trazendo uma certa ambiguidade. Enquanto isso, Cillian Murphy traz uma faceta completamente diferente ao protagonista, sendo ela, na maior parte do tempo, com sentimentos íntimos. A escolha de trabalhar os olhares de um homem que já morreu por dentro, junto de sua aura apática e claramente arrependida, é esplêndida.
Mas o fator determinante da experiência é aquilo que todo mundo espera: a explosão. O diretor, sendo um artista extremamente técnico e crível à nossa física, não poderia ter mostrado esse aspecto de forma mais grandiosa à tela de cinema. O fato de o som acontecer muito tempo depois da luz já emitida acaba trazendo uma sensação completamente desconcertante. Pois ali, o que nos está sendo transmitido, é a reação das pessoas, com foco em suas respirações. Para, então, vir o estrondo que vibra até a alma. E isso é construído desde o primeiro ato. O protagonista possui esses vislumbres que gradativamente desenham o acontecimento em nossas mentes, mostrando como até os detalhes mais pequenos são destrutivos e gritantes. Isso se reflete até na forma escandalosa de seus bebês chorarem.
Portanto, Oppenheimer é a perfeita construção do caos. Aliás, a trilha sonora de Ludwig Göransson acrescenta à trama em todas as suas variações! Seja no aumento do perigo, da desconfiança e até em algo mais envolvente. O trabalho pomposo e pontual realizado no som, juntamente de todas as escolhas artísticas de Christopher Nolan e Hoyte van Hoytema para a experiência visual, trazem um resultado impactante, magnético e delirante. A última cena, que mistura tudo isso, é simplesmente apoteótica!