O atual vencedor do Prêmio do Júri em Cannes e selecionado em sequência para outros festivais de cinema, o filme Bacurau, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, desafia-se a noções pré-concebidas de “maior longa de gênero brasileiro”, e de possível candidato ao Oscar 2020. Este que é um filme único, que busca nas raízes do DNA nordestino a motivação para contar essa história, violenta, atual e recheado de críticas ao cenário político atual.
Quando uma cidadezinha do sertão nordestino some do mapa, e assassinatos começam a acontecer misteriosamente, os cidadãos da comunidade se unem para preparar uma possível reação. E reação está que não se dá nada por pacifista, visualmente descrita como clássicos “Tarantinescos”, onde o gore culmina com o humor, e deságua numa sessão de violência inimaginável para o espectador.
O roteiro constrói uma história que gradualmente se revela passo a passo a situação que estamos vendo, gerando diferentes sensações, causando um suspense de não saber o que vem a seguir, por conta das grandes mudanças da dramatização. Por exemplo, no primeiro ato do filme, a sensação é de assistir a um longa comum entre os já lançados no Brasil, onde uma cidade pobre sofre nas mãos de políticos corruptos, que usam da humildade do povo para se beneficiar. Já no segundo ato, o filme muda completamente o seu tom, passando de humor e drama conhecido pelos brasileiros, para um suspense, mais vistos em filmes trash-americanos. Até concluir-se no terceiro ato onde o tom muda de forma magnífica e certeira, para um outro tipo de atmosfera, inesperada pelo espectador.

A fotografia aberta do sertão, que visualmente lembra filmes de western em alguns momentos, ajuda a transmitir a atmosfera do ambiente, tornando o longa ainda mais interessante. E a ótima atuação de Sônia Braga como Domingas e Silvero Pereira que faz o intrépido e perigoso Lunga, melhoram ainda mais a experiência cinematográfica.
Bacurau é um filme que toca em todas as feridas da nossa sociedade. Temos diversas críticas a situações de contexto atual no nosso país, como a questão da glamourização do armamento, a questão da xenofobia e a violência exacerbada, além de algumas alfinetadas a política atual. A realidade que o país vive é exposta pelos roteiristas, de modo sutil e em alguns momentos subjetivo. A política não é o foco, mas não é esquecida no decorrer do longa.
A dupla Mendonça e Dornelles, entregou um longa para assistir e refletir, uma obra estranha, sanguinária, intrigante e maravilhosa, sem sombra de dúvidas um dos maiores filmes de gênero brasileiro.