Dirigido por Danny Philippou e Michael Philippou, Fale Comigo chegou aos cinemas em 17 de agosto e tem sido sucesso desde então. O longa levou mais de 500 mil brasileiros ao cinema e manteve o segundo lugar no ranking de bilheteria nacional por duas semanas. Na bilheteria mundial, arrecadou mais de 50 milhões e vem sendo cada vez mais bem-recebido pelos amantes do terror.
Aqui, temos a estreia dos promissores irmãos Philippou no cinema, sendo que, curiosamente, a experiência prévia dos cineastas vem do YouTube. Esse projeto independente, que teve os direitos adquiridos pela A24, foi ovacionado no Festival de Sundance e já tem até sequência confirmada. Mas, será que é tudo isso mesmo? Agarre na nossa mão e venha descobrir.
No filme, um grupo de amigos descobre como conjurar espíritos usando a escultura de uma mão enfeitiçada. Viciados nessa nova emoção, uma das jovens acaba indo longe demais e libera forças sobrenaturais aterrorizantes. Agora, todos correm grande perigo e precisam reverter a situação quanto antes.
A qualidade presente em Fale Comigo

Acima de tudo, o filme entregue se mostra extremamente bem feito. Junto de Hereditário e Fresh, aqui existe mais um bom exemplo de terror escuro, mas nunca dessaturado. A fotografia consegue sintonizar a coloração dos ambientes e objetos de modo soturno e visível, instaurando logo a atmosfera do sombrio. O orçamento não engloba nem 5 milhões de dólares, porém, cada centavo se expressa devidamente bem usado. Assim, imediatamente pode-se notar o refino visual, não somente na maquiagem com textura veraz, mas na própria iluminação com foco em tons amarelados; fazendo rima com a luz que emana da vela acesa, bem como o propósito de trazer com intensidade um sentimento de traição e aperto.
As escolhas de direção também são sagazes e bem-intencionadas. O núcleo central do filme é adolescente, mas isso nunca cai num tom infantojuvenil bobo, que causa aversão ao espectador. Mesmo que com atitudes questionáveis, os jovens em questão não são tolos ou vagos. O filme os retrata como a atual juventude realmente é, utilizando aspectos sobrenaturais como pretexto para flertar com conflitos reais. A trilha sonora mesmo — excelente, por sinal —, reflete a jovialidade moderna, com as festas e curtição, mostradas por algumas vezes na história. Ou seja, universo natural soa tangível à realidade de 2023.
Nesse sentido, as jogadas de câmera são excepcionais. Como o filme quer adentrar em seus elementos sobrenaturais, por diversas vezes as movimentações bruscas fazem com que sejamos imersos nisso com desorientação e estranheza. Ou até mesmo os mais sutis, que nos situam com clareza e serenidade de um cenário já fora dos padrões reais. Então, existem variações de tom muito bem orquestradas, somadas a uma montagem que compreende e ilustra isso tudo com precisão.
A exploração do terror psicológico

O filme não apresenta um uso excessivo de gore, embora tenha. Ele se concentra mais em pontualidades de uma violência que impacta pelo inesperado. Nem sempre é pelo sangue, mas pelo conceito e construção de como é mostrado. Analisando essas cenas isoladas, somos nocauteados por ideias que sugestionam o desconfortável, encenadas de modo grotesco com todos os elementos ao redor. Os cenários, pessoas e objetos estão o tempo todo correspondendo a essa brutalidade do espantoso. Assim, existe um senso de unidade em que tudo e todos reagem ao conflito principal, o que deixa muito mais assustador.
Ainda assim, este é um filme imensamente psicológico. Os espíritos, a mão do vidente e todas as regras que compõem o lado obscuro da trama podem ser interpretados como uma metáfora. Em suma, essas informações servem para representar temas como: traumas, culpa e enganação. Temos uma protagonista frágil, que em meio à toda essa loucura espiritual, passa pelos estágios do luto, bem como o uso de drogas e más influências ao redor (apesar de ainda ter quem a apoie). Então, o fato de estarmos o tempo todo sob seu ponto de vista é o grande acerto do filme; pois existe essa ambiguidade de não sabermos se ela está conseguindo resolver seus problemas ou não. A cada novo passo tudo fica mais próximo de acabar, mas pode ser que no mal sentido.
Portanto, Fale Comigo, talvez seja, o melhor filme de terror de 2023. O longa equilibra sublimemente a sua visão do maligno extraordinário com o conteúdo palpável. E mesmo que as camadas narrativas e visuais sejam trabalhadas de maneira que o destino inevitável gradualmente se mostre, os últimos segundos são de deixar qualquer um de boca aberta. Aqui, nasce o clássico de uma geração, que ainda será referenciado (e muito) no futuro.