Nos anos 40, as mulheres foram inseridas em diversos locais de trabalho para suprimir a falta de homens que estavam lutando na Guerra. Gradualmente surgiram enfermeiras, operárias em fábricas de armamento e decodificadoras de mensagens em escritórios. Mesmo assim, se torna claro que Hollywood diminuiu a participação do sexo feminino nas guerras, sempre as colocando de fora da narrativa, raramente no papel de protagonistas.
Mas, talvez você tenha ouvido falar das chamadas Bruxas da Noite, as aviadoras soviéticas que receberam o apelido por entrarem no conflito bélico com seus aviões, bombardeando os soldados alemães no silêncio da noite com seus motores desligados.
O surgimento das Bruxas da Noite
Era 8 de outubro de 1941 quando o ditador comunista Stalin decretou que as mulheres voluntárias fossem batalhar contra os nazistas que estavam ganhando. Não demorou até que surgissem mais de um milhão de voluntárias, que ocuparam espaços de poder. Porém, foi no ano de 1942 quando a corajosa aviadora Marina Raskova propôs a criação de três regimentos femininos.
A pioneira Raskova tinha boas relações com Stalin, e assim, logo surgiram os primeiros regimentos de combate aéreo femininos: Divisões 586, 587, e por último, o 588º, o Regimento de Bombardeio Noturno, em que suas combatentes ganhariam depois a denominação de “Bruxas da Noite”.
O Regimento de Bombardeio Noturno utilizava o modelo biplano Polikarpov Po-2 (também conhecido como U-2), um avião que era bom para uso geral, mas não era o mais adequado para combates. A velocidade máxima de um Polikarpov Po-2 era de 152 km/h, enquanto até mesmo a velocidade mínima de um caça alemão era maior que a máxima dos biplanos soviéticos, assim, era ainda mais difícil abatê-los.
Dois anos depois, elas ainda voavam sem paraquedas para poderem carregar mais bombas, e se orientavam majoritariamente por bússolas. Planando baixo sobre as áreas nazistas, o som que se ouvia era de um farfalhar baixo, como uma vassoura que não tocava o chão, uma vassoura voadora. Aterrorizados, os alemães as nomearam de “Bruxas da Noite” — ou Nachthexen, em sua língua nativa.
O machismo no Exército Soviético
Segundo a pesquisadora Lyuba Vinogradova, as Bruxas eram um grupo privilegiado se comparado ao resto das mulheres do exército soviético, que eram assediadas e abusadas em maior escala. Era claro, que, mesmo que algumas das garotas fossem muito mais experientes no voo que homens, ainda eram testadas por sua competência ou coragem mais que o necessário. O machismo também se fazia presente através de uma discriminação indireta, onde eram ignoradas e chamadas de ‘bonecas’.
“Eu não quero enviar você em uma missão, você é muito bonita“
— Comandante do regimento de combatentes para a pilota Raisa Belyaeva;
Por outro lado, se as aviadoras se mostravam competentes, era complicado para que fosse entendido de que as mulheres podiam ser capazes e, ainda sim, ter um lado mulheril. Lilya Litvyak, conhecida como Rosa Branca de Stalingrado, era o exemplo perfeito: pequena, bonita, estilosa, flertava com pilotos e amava roupas. Contudo, Lilya ainda era o terror dos alemães, a garota vingadora. Como uma garota ousava gostar de maquiagem e de bombas ao mesmo tempo?
“Quando vejo um avião com as cruzes negras e a suástica na cauda, tenho apenas um sentimento: ódio; essa emoção me faz apertar ainda mais firmemente o gatilho das minhas metralhadoras“
— dizia Lilya Litvyak, a garota vingadora;
Até mesmo o apelido que ganharam tinha uma certa conotação negativa, uma maneira de zombar das aviadoras, e conectá-las a uma figura feminina malévola: a bruxa. No livro Bad Girls Do It!: An Encyclopedia of Female Murderers — que fala sobre mulheres assassinas —, é dito que eram usados truques para minimizar a violência feminina: é fácil desumanizar uma mulher e transformá-la em monstro, feiticeira ou qualquer coisa para parecerem inofensivas. É mais fácil acreditar que mulheres são vampiras ou bruxas do que capazes de matar homens.
Legado
Fome, frio, péssimas vestimentas, aviões inferiores… Nada disso impediu que as Bruxas da Noite cumprissem as missões que lhe foram entregues. De números, temos 2400 missões cumpridas e 23.000 toneladas de bombas jogadas. Considerada a unidade mais condecorada da Força Aérea Soviética. Filmes foram produzidos, livros foram publicados.
Todavia, sem dúvidas, as Bruxas da Noite deixaram um legado muito mais impactante que qualquer número: essas jovens pavimentaram o caminho, rasgaram os céus para que outras moças pudessem trilhar não só no caminho da aviação, mas em qualquer área que fosse desejada. As Bruxas da Noite mostraram que as mulheres eram tão capazes quanto homens, e que podiam trabalhar em conjunto, se tornar uma unidade, e ainda se manterem fiéis à sua essência. Juntas, demonstraram a força que poderiam exercer sobre o mundo quando oportunidades justas surgiam.
Naquelas noites, voando em meio às estrelas, não derrotaram somente nazistas, fizeram renascer a esperança nas jovens que sentiam que suas vidas estavam fadadas a roteiros já planejados. As Bruxas da Noite combateram, inovaram e nunca mais recuaram.
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Você já ouviu falar sobre essa história?
Fontes: Mídia NINJA, Aventuras na História