Estamos em 1973, um dos períodos mais difíceis da ditadura militar no Brasil. É em um ambiente marcado pela paranoia, onde Miguel, agente do setor de inteligência da polícia civil, se especializou em se infiltrar nas gangues que estão sob investigação. Em uma dessas operações, ele se aproxima de um grupo de ladrões de carga, que confraternizam num bar, e contacta Ingo, o chefe que não só apadrinha sua entrada na gangue, mas o apresenta a sua irmã Nádia, com quem Miguel estabelece uma relacionamento com muito fervor. Profissionalmente vaidoso, Miguel sente que no devido tempo não terá problemas para romper os laços que se desenvolveram durante a operação. Mas as coisas não saem como ele imagina. Apaixonado por Nádia, Miguel se surpreende com as dúvidas sobre de que lado estará quando for fechado o cerco à quadrilha.
A obra a ser resenhada neste artigo é um romance policial, chamado Baixo Esplendor, lançado no dia 9 de abril de 2021, escrito pelo autor brasileiro Marçal Aquino, e publicado pela editora Companhia das Letras. Marçal nos traz a história de um agente do setor de inteligência da polícia civil, que em meio ao ambiente pesado e paranoico do regime militar na década de 70, se especializou em se infiltrar nas gangues sob investigação. Mesmo tendo um trabalho tão insalubre, onde tem que se aproximar de pessoas tão instáveis, Aquino quis nos mostrar a parte humana dos personagens, tanto o mocinho, quanto os vilões, por assim dizer… Todos motivados por suas próprias ambições, emoções, êxito no trabalho.
A trama contém 264 páginas e se divide em três atos: Suor, Sêmen e Sangue. O primeiro ato nos apresenta Miguel o personagem principal da história e a sua cautelosa aproximação à Ingo, o chefe da quadrilha e Moraes, seu fiel braço direito. Já quase findando este ato Miguel é apresentado a irmã mais nova de Ingo, Nádia, por quem desperta uma paixão intensa, que de início esse sentimento foi mascarado como apenas assunto de trabalho, doce engano do nosso herói.
Nádia e Miguel descobriram afinidades — ou pelo menos ele afirmou coincidir em várias coisas que a agradavam, ainda que nem sempre fosse verdade. Miguel procurava manter a consciência do personagem que interpretava. Um caso de honestidade com a mentira. Na realidade, eles eram muito diferentes, e talvez nisso resida parte da graça de tudo que aconteceu depois.
Já em Sêmen, nos conta o desenvolvimento da afinidade de Miguel e Ingo, que o recebeu de braços abertos na gangue, confiando ao nosso herói os planos da trupe e a bênção do relacionamento de Miguel e Nádia. O casal dessa história é o foco, pois como próprio Marçal diz “Eles são dois sujos que se amam com pureza“, e de fato, dois sujos, Miguel com suas omissões do seu verdadeiro ofício e Nádia que omitia os trabalhos nada dignos de seu irmão. E é aqui que a paixão dos dois vem a tona com todo o vapor, um relacionamento regrado de muitos cuidados por parte de Miguel e sentimentos a flor da pele por parte de Nádia, que com toda a sua desenvoltura e sensualidade fisga fácil, fácil o agente.
Se atracaram no corredor com algo de fome e desespero e se buscaram com fúria. Miguel puxou o corpo dela com força para junto do seu e o pressionou com vigor contra a parede. Nádia gemeu. O que as bocas —e as línguas —faziam não pode, de maneira nenhuma, em nome dos bons costumes, ser classificado como beijo. Nádia pediu uma trégua.
O terceiro e último ato é Sangue, onde acontece o desfecho desta história, que não cabe aqui falarmos, para não estragarmos a magia dessa cativante trama.
O acaso é o jeito que Deus encontrou para escrever seus poemas.
Baixo Esplendor te prende do início ao fim, num enredo simples, porém muito bem escrito, com ação, tensão, paixão — muita, mas muita paixão —, os dramas do cotidiano de ambas as partes (do agente e da gangue), e seus personagens cativantes — pessoalmente, criei um certo afeto pelo Ingo, acontece? É, né?! — e detalhadamente desenvolvidos, até mesmos os que aparecem apenas uma vez na história, como o caso de Celião e Marujo.
A trama foi contada de forma suave, que nem nos damos conta de terminarmos a leitura, como uma novela que você acompanha capítulo por capítulo, e mesmo se tratando de um clichê romântico, você ainda sente certa ansiedade em “descobrir” o resto da história. Há o vilão de ressurge de forma inesperada que te faz pensar “Mas que cara f*** d*** p***!”, e depois fica feliz por saber o destino do mesmo, e também tem a tensão, e o fio de esperança, mas depois o choro e o pesar… — Depois que eu terminei de ler, contei a história e o final para minha amada, que mesmo sem ter lido, sentiu o mesmo que senti, pela força da história com um desfecho bem estruturado.
Baixo Esplendor é uma ótima leitura, com certeza, para quem não conhece o trabalho do Marçal, este é um bom título para introduzi-lo no seu meio literário.
O escritor Marçal Aquino é também repórter e roteirista de TV e cinema. Foi revisor, repórter e redator dos jornais O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde. Atualmente é jornalista freelancer e contribuiu recentemente para a revista Época São Paulo, também é vencedor do prêmio Jabuti pelo volume de contos O Amor e Outros Objetos Pontiagudos, publicado pela Geração Editorial em 1999.