Em 1816 a escritora, famosa, provavelmente se debruçava na cama enquanto tentava escrever mais uma frase para um de seus romances, publicado posteriormente a sua morte.
Em plena juventude, Anne Elliot se apaixonou pelo oficial da marinha, capitão Frederick Wentworth. Persuadida por seus próximos, ela abandona seu relacionamento amoroso pela instabilidade financeira. Após oito anos, ambos se encontram em um cenário diferente: Frederick é um oficial estimado e com boas condições financeiras, que anda cortejando sua vizinha; Louisa Musgrove.
Persuasão se diferencia de suas obras anteriores: somos apresentados a uma protagonista forte, de idade avançada e que resiste às próprias vontades. Apesar de sua sagacidade, a caridade de Anne Elliot se sobressai fazendo com que suas decisões sejam influenciadas pelos que estão ao seu redor.
Todavia o estilo de Austen se faz presente desde o início, com suas críticas recheadas de sarcasmo à sociedade inglesa do século XIX e o enredo simples, mas carregado de detalhes.
Não se pode deixar de comentar sobre o sentimentalismo, surpreendente e positivo, que invade a obra.
Certa vez, a autora Charlotte Brontë descreveu Orgulho e Preconceito como um jardim cultivado, elegante e delicado, mas sem um único relance de luz, de terra aberta, de ar fresco.
Em Persuasão é notável que um reflexo de luz permeia a obra. Desde o início vemos vislumbres dos sentimentos de Anne. É possível ter a chance de sentir medo, saudade, ressentimento e indignação da personagem, de maneira muito mais profunda do que seria o esperado.
Frederick parece estar alheio ao que aconteceu no passado. Ele é visto como alguém distante, até frio, na maior parte do tempo. O capitão Wentworth usa de seus artifícios para machucar quem o feriu, mas não deixa de demonstrar sua confusão quanto ao seu interior. Além disso, sua cordialidade é evidente no contato com Anne. Os encontros e desencontros fazem com que Anne se sinta vulnerável e nostálgica, remoendo sua decisão anterior. A torcida para que ambos superem a insegurança e dêem o primeiro passo é enorme, mas a falta de diálogo contribui para a distância.
Vale ressaltar que Jane Austen não constrói suas personagens de forma plana. Seus “filhos” são dotados de muitos adjetivos, na maioria das vezes, opostos entre si. Muitos escritores tendem a fazer com que o dinheiro seja o maior vilão da história. Em contraponto, Anne é uma mulher que se preocupa com o dinheiro e recusa o amor pela segurança financeira, mas em nenhum momento é taxada como oportunista ou gananciosa.
Fica evidente que Srta. Elliot é uma homenagem a todas as mulheres, as que queriam uma segunda chance, uma chance de errar e de se reerguer.
Obviamente Srta. Austen não resistiria a um final feliz e o amor vence mais uma vez…