O retorno de David Lowery para cadeira de diretor não poderia ser mais icônico. Com a melhor atuação da carreira de Dev Patel, A Lenda do Cavaleiro Verde é um épico medieval que subverte e inova, além de apresentar um dos universos mais envolventes e vastos do cinema nos últimos anos.
Parte dos espectadores conheceram o trabalho de Lowery no sucesso independente A Ghost Story, que foi bastante apreciado pela comunidade cinéfila no ano de 2017, graças a importância da temática e ao nível de inventividade da obra. No trabalho mais recente, o diretor repete a maestria e apresenta outra narrativa igualmente incomum e contemporânea.
Ainda que A Lenda do Cavaleiro Verde seja adaptação de um conto arturiano do século XIV, não espere encontrar o repetido e idealizado mito do jovem que retirou a espada da pedra e se tornou rei, ou a história da busca pelo Santo Graal. Ao invés do heroísmo padrão e das figuras mitológicas sublimes, assiste-se um realismo mágico, que mescla a fantasia do medieval com atuações e cenários tangíveis.
A narrativa é focada em Gawain, sobrinho do Rei Arthur interpretado com excelência por Dev Patel, ator já muito reconhecido em função dos trabalhos em Quem Quer Ser um Milionário? e Lion: Uma Jornada Para Casa, mas que aqui, supera ambas performances.
No enredo, o jovem aceita participar de um infeliz desafio feito pelo místico Cavaleiro Verde, o qual muito provavelmente acabará com a própria morte. Dessa forma, a trama relata a jornada vacilante de Gawain rumo ao seu destino.
O trajeto apresentado é amplamente fantasioso e simbólico, mas também repleto de uma realidade que imerge o espectador na aventura. Se os contos medievais fossem verdadeiros, o universo sujo, sombrio, confuso, miraculoso e alegórico de Lowery teria os representados com perfeição.
Outro grande traço de autenticidade no enredo vai para o conflito de Gawain, que está longe de representar o forte, honrado e impecável cavaleiro dos filmes clássicos ou blockbusters, visto que ele comete erros, pensa em desistir e tem medo da morte.
Talvez ainda mais surpreendente que a própria narrativa, seja descobrir que A Lenda do Cavaleiro Verde alcançou um grande apuro estético e sonoro, sem abdicar do teor épico e grandioso da história e, mesmo assim, conseguiu se manter no enxuto orçamento de 15 milhões de dólares. Para efeito de comparação, o recente Rei Arthur: A Lenda da Espada, que possui a mesma época histórica como pano de fundo, contou com a quantia de 175 milhões de dólares.
Tanto a partir do bom uso da iluminação e dos cenários naturais, quanto da refinada mescla entre efeitos práticos e especiais, origina-se um dos mais belos e densos mundos cinematográficos dos últimos anos. E além dos êxitos em fotografia, direção de arte e produção, o espectador ainda é presenteado com uma trilha sonora bela e memorável.
O roteiro e a direção também foram competentes em permitir que todo elenco brilhasse. Destaque aqui para Alicia Vikander, que tem um ilustre monólogo, assim como para Ralph Ineson, pelo excepcional trabalho de corpo, voz e caracterização com o Cavaleiro Verde. Ênfase também em Erin Kellyman, que ficou conhecida no início do ano por interpretar a “vilã” de Falcão e o Soldado Invernal, e que no filme tem uma singela e bonita participação.
Em síntese, A Lenda do Cavaleiro Verde novamente demonstra que a assinatura de David Lowery é sinônimo de talento para contar novas histórias e primazia técnica na produção.