Dirigido por James Gunn, Guardiões da Galáxia Vol. 3 chegou aos cinemas na última quinta-feira (4). Fazendo parte da Fase 5 do UCM, o longa, na verdade, era para ter sido lançado pouco tempo após Vingadores: Ultimato, em meados de 2020. Contudo, a Disney demitiu Gunn em 2018 após o ressurgimento uma de série de postagens controversas no Twitter, onde o mesmo fazia piadas de extremo mal gosto. Esse resgate aos Tweets ocorreu por perfis favoráveis ao governo de Donald Trump, que, na época, Gunn tinha se posicionado contra. O cineasta se desculpou publicamente por diversas vezes, visto que estas piadas estavam atreladas a uma versão sua do passado que não o representava mais, afinal, foram publicações feitas entre 2008 e 2011.
Nesse tempo, ele foi contratado pela DC para comandar a sequência de Esquadrão Suicida, da qual teve absoluta liberdade criativa para explorar o que quisesse, com quais personagens quisesse. Em decorrência disso, ele fez Pacificador e hoje é um dos presidentes da DC Studios. Em meio à toda essa situação, a Marvel acabou reconsiderando e o encaixou no projeto novamente. Mas o cineasta só iniciaria Guardiões da Galáxia Vol. 3 de fato após finalizar o que foi inicialmente contratado para fazer na DC. Dito e feito.
Dessa forma, sabemos que apenas Gunn poderia ter finalizado a história dos Guardiões da Galáxia. Ele foi responsável não somente por introduzir o lado cósmico do UCM, mas também, estabelecer esses personagens que o público tanto amou e acompanhou desde 2014. Assim, todo o material do filme estava prometendo uma despedida digna e emocionante. E será que realmente foi?
Nessa conclusão, os Guardiões estão se estabelecendo em Luganenhum. Contudo, não demora muito para que suas vidas sejam reviradas, visto que o passado turbulento de Rocket (Bradley Cooper) vem à tona. Nesse tempo, Quill (Chris Pratt), que ainda está se recuperando da morte de Gamora (Zoë Saldaña), deve reunir a equipe em uma arriscada missão para salvar a vida de Rocket.
O grande personagem de Guardiões da Galáxia 3
Logo nos primeiros cinco minutos, Gunn apresenta o ponto de vista daquele que seria primordial para essa história: Rocket. Esse personagem que, nos dois filmes anteriores, vinha sendo construído como alguém que, através do humor cínico, escondia suas fragilidades emocionais. Porém, mais do que nunca, agora ele é o batimento cardíaco do filme. Conforme a excelente intercalação de flashbacks acontece, adentramos mais em tudo que o torna tão complexo. E esse é um dos maiores poderes de James Gunn como cineasta: tornar o mais real possível aquilo que simplesmente não existe. Esse guaxinim não existe e nem os outros animais modificados. Porém, quanto mais tempo acompanhamos esses sonhos e anseios por liberdade através dessas criaturas tão frágeis e inocentes, mais ficamos envolvidos e acreditamos nessa fantasia disfarçada de verdade.
Nesse sentido, temos o melhor vilão dos filmes Guardiões da Galáxia: o Alto Evolucionário; ele é a figura ameaçadora da qual sentimos realmente repulsa ao assistir. Em simultâneo, Chukwudi Iwuji estabelece uma fala calma e metódica, quando as obsessões do personagem vêm à tona ele externaliza um tom verdadeiramente odioso. Isso também é incrementado por todas as crueldades que compõem esse personagem dentro do texto. Assim, esse não precisa ser um vilão com motivações entendíveis para funcionar como uma ótima figura antagônica para a história. Ele é de fato perverso e possui presença.
Assim, um dos vários grandes feitos do filme é utilizar o maior medo que existe para guiar esta história: a morte. Esse fator, embora tenha suas subversões, é usado para refletir o passado e tudo aquilo que nos tornou o que somos, seja pela raiva e dor que carregamos, mas também pelas próprias memórias genuinamente boas e puras que fazem tudo ter um pouco mais de sentido. Mesmo que ainda haja bastante humor e outros aspectos mais otimistas, Gunn eleva a narrativa a outro patamar. Não é só pela estrutura que se mostra bem balanceada e dividida de modo dinâmico, mas aqui há momentos realmente trágicos, melancólicos e desesperançosos, que irão te despedaçar com tamanho impacto construído. E, ao fim, Rocket acaba sendo o grande pilar de tudo.
Um adeus digno
É impressionante como o filme tem a melhor versão de absolutamente cada Guardião da Galáxia. Os personagens estão com arcos mais definidos, apresentando mais maturidade e uma evolução condizente com o que veio antes. Existe uma ressignificação de tudo o que já assistimos, tornando ainda mais rico. Fora que as cenas de luta também impressionam, há sequências completamente fantásticas com Groot, por exemplo. Não estamos lidando com um filme que apresenta várias pistas futuras para o UCM, ele acaba sendo de extrema importância, mas para seus próprios personagens e história que vem sendo contada há quase uma década. A morte, citada anteriormente, causa uma grande sensação tensa que a direção evoca perfeitamente: todos eles estão suscetíveis e, quase sempre, em desvantagem. Em muitos momentos sentimos aquele frio na barriga.
A própria introdução de Adam Warlock, de maneira fria e bruta, causa esse inesperado mal-estar e senso de periculosidade. Aliás, o que Gunn faz nas cenas de voo e habilidades desse personagem é inigualável! É interessante como o cineasta evoluiu muito com o decorrer dos anos, amadurecendo também seu estilo de encenação. É curioso como ele aborda até um lado mais bíblico e divino em diversos momentos. Ele traz o seu estilo arrojado de filmagem de O Esquadrão Suicida, mas também estabelece uma agilidade sequencial diferente. Não é apenas pela magistralidade na ação contínua e empolgante com a trilha ao fundo, mas por como todos os personagens estão em sintonia e complementam o embate um do outro. É um vínculo que sustenta todos os maneirismos visuais, inclusive as poses que funcionam tanto.
Portanto, Guardiões da Galáxia Vol. 3 se encerra como o capítulo mais consistentes das trilogias de filmes de super-heróis. Essa despedida encerra, de maneira sublime, a história de todos os personagens. Todos saem dessa aventura diferentes, não ficando abalados porque a aventura acabou, mas celebrando que agora finalmente entendem o seu propósito. Perceba como a primeira cena corresponde a última, e como a lontra Layla afirmou uma verdade: O Rocket sempre foi o principal dessa história, mas não havíamos percebido. É realmente lindo, emocionante e vibrante o que esse brilhante James Gunn fez.